FRIZA| O FALSO PERTENCIMENTO GERACIONAL

Após a revolução tecnológica causada pelas redes sociais e pelos smartphones na última
década, é evidente o quanto pré-adolescentes, adolescentes e jovens têm diminuído seus
índices de felicidade e de pertencimento ao que os cerca. Algo aconteceu com essa faixa
etária que, até agora, não conseguiu superar tal situação.
Vale relembrar como foi a última década para quem já tinha certa idade e acompanhou de
perto essa transição: entre 2010 e 2015, a geração Z, ainda em formação, viveu o período
em que a maioria dos jovens passou a ter acesso a smartphones e, por consequência, às
redes sociais. O Instagram estava em seu auge após ser comprado pela Meta. O Facebook
ainda não era visto como espaço de “boomers”. O Snapchat ditava o ritmo dos stories,
insistindo em mostrar cada detalhe do dia, como até hoje fazemos no Instagram. Tudo isso
sem qualquer moderação ou filtro. Foi um avanço muito rápido e muito intenso.
De repente, passamos a ter acesso a tudo, o tempo todo. Começamos a comparar nossos
corpos e imagens a cada instante. Nossas opiniões ficaram cada vez mais atreladas a
curtidas, comentários e reações. E, pouco a pouco, fomos perdendo algo essencial da
nossa condição de ser humano. Como já alertava a pesquisadora Sherry Turkle, em
Sozinhos Juntos: Por Que Esperamos Mais da Tecnologia e Menos uns dos Outros (2011),
nunca estivemos tão conectados e, ao mesmo tempo, tão sós.
Não por acaso, as eleições de 2018 por aqui se tornaram polêmicas e destruíram relações
em inúmeros lares e círculos de amizades. De repente, todos começaram a se politizar, ou
ao menos acreditar que estavam politizados. O senso comum do Sul e do Sudeste se voltou
contra o Norte e o Nordeste. O resultado foi um algoritmo vencedor e uma nação dividida,
fragmentada, ferida.
Com o passar do tempo, alimentados cada vez mais por algoritmos, fórmulas e ecos de
grupos narcisistas, chegamos à constatação de que nunca foi tão fácil “pertencer” e, ao
mesmo tempo, nunca foi tão difícil realmente fazer parte de algo. Um sociólogo que gosto –
e é bem popzinho para adolescente, mas pouco estudado de fato – é Bauman, Zygmunt
Bauman, que chama esse fenômeno de “vida líquida”: vínculos que se desfazem com a
mesma velocidade com que são criados. A lógica das redes sociais intensificou esse
processo, transformando até mesmo nossas identidades em produtos descartáveis,
moldados pela tendência do momento.
Nas redes, bastam dois cliques para se tornar integrante de um grupo, de uma moda, de
uma causa ou de uma ideologia. Mas é um pertencimento frágil, que desaparece quando o
algoritmo muda, quando a atenção se volta para outro assunto. Jonathan Haidt, em A
geração Ansiosa (2024), mostra como essa promessa de pertencimento digital coincidiu
com a explosão de problemas de saúde mental em adolescentes. A geração Z cresceu sob
a ideia de que estaria sempre acompanhada, mas a realidade foi um aumento sem
precedentes de solidão, ansiedade e depressão.
No fundo, confundimos visibilidade com vínculo. E estamos perdidos nisso. Precisamos
resgatar a diferença entre eles. Ser visto não é o mesmo que ser amado; estar conectado
não é o mesmo que estar presente. O verdadeiro pertencimento não nasce de algoritmos,
mas da vida concreta: no olhar de um amigo que escuta sem pressa, no abraço da família
que acolhe sem precisar de legenda, na comunidade de fé que nos chama pelo nome e não
pelo número de seguidores ou por um repost de sucesso. Pertencer de verdade é viver
enraizado no que permanece, e não se desfazer na espuma de uma timeline que
desaparece em 24 horas.
Nunca uma geração foi tão exposta à promessa de pertencimento, e nunca uma geração se
sentiu tão ansiosa por não conseguir alcançá-lo. Se não resgatarmos vínculos reais como
família, amigos, comunidade e fé corremos o risco de formar não apenas uma geração
ansiosa, mas uma geração órfã de sentido.

Bruno Friza é colunista do Folha Cabista. Professor de Geografia e de Português, ele combina uma visão crítica com uma sensibilidade única, capturando as nuances do cotidiano e das relações humanas.
Apaixonado por viagens e pelo contato com diferentes culturas, ele acredita que cada pessoa carrega uma história única que merece ser compartilhada.